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sábado, 15 de fevereiro de 2014

Da Redação - Entrevista Marcos Bazzana Delgado - Presidente da Associação de Inspetores das Guardas Municipais

A Associação dos Inspetores das Guardas Municipais foi fundada em São Paulo por integrantes do concurso de ingresso para o Cargo de 2º Inspetor da Guarda Civil Metropolitana, atualmente é presidida pelo Senhor Marcos Bazzana Delgado, que atendeu o convite de Os Municipais e concedeu entrevista ao Wagner Pereira nos dias 11 e 12 de fevereiro.

1 - A Associação dos Inspetores das Guardas Municipais - AIGM completa 13 anos em 2014, qual o balanço que o Senhor faz da atuação da entidade? Porque o Blog está inativo?

A Associação nasceu como Associação de Alunos Inspetores, e teve como escopo principal garantir a posse dos concursados por meio do ingresso na Guarda Civil Metropolitana no cargo de 2º Inspetor. Depois de empossados, pensamos: Por que não transformá-la em Associação de Inspetores, visto que ainda não existia nenhuma entidade que congregava essa categoria?. Então, criamos essa associação que ai está.

O balanço é sempre positivo, porque uma associação jamais pratica ações em prejuízo da categoria. O pouco que se conquista já é alguma coisa. Tivemos bastante abertura e reconhecimento em gestões passadas. Participamos de reivindicações de reajuste junto com outras entidades de classe. Tomamos assento em muitas das mesas de negociações. Participamos de eventos externos, como no caso do lançamento da Frente Parlamentar em Defesa das Guardas Municipais, sediada em Brasília. Uma das mais importantes conquistas aos inspetores que posso citar, e saiu da iniciativa de nossa associação, foi a criação da lei que instituiu a gratificação de chefia e o cargo comando exclusivo de carreira.

O blog está inativo porque a Associação de Inspetores acabou saindo de cena para dar oportunidade a outra Associação, a ABIG – Associação Brasileira de Inspetores de  Guardas.

2 - Como o Senhor avalia as entidades que se vinculam a partidos políticos?

Não sou contra. Mas acredito que deva haver isenção, com separação das causas. Não vejo mal em os dirigentes das entidades terem as suas preferências políticas, desde que saibam distinguir cada momento. Por exemplo, se o partido que está no governo é o mesmo da filiação do dirigente, este tem que optar pela categoria em caso de haver conflito de interesses. Se o dirigente da entidade pretende sempre ficar ao lado do governo, inclusive nos casos em que a categoria está contra a proposta governamental, seria ético que se afastasse da entidade e militasse apenas nas causas do partido. A minha causa, a minha luta é pela Guarda Civil. Eu não tenho filiação partidária, mas, se tivesse optado por uma, e houvesse uma divergência de interesses entre o meu partido e o interesse da categoria, ou optaria pela minha profissão, pelo melhor para a minha categoria. A minha ideologia é muito mais profissional que política, desta forma, eu perderia o interesse de permanecer em um partido que diverge das minhas aspirações profissionais.

3 – A Associação de Inspetores teve uma participação ativa na administração Gilberto Kassab, participando efetivamente de projetos que mudaram significativamente a gestão da Guarda Civil Metropolitana de São Paulo, como a criação da função gratificada, porém observamos um distanciamento da entidade na administração atual, o que ocorreu?

No último ano da gestão Kassab apareceu a mim uma oportunidade de crescimento profissional, e eu ocupei um cargo em comissão relevante. Aceitei o desafio de ser o Comandante Operacional da zona Norte. Achei que lá poderia fazer algo bom para a instituição e mudar um pouco a velha forma de comandar para então implantar uma filosofia mais humanizada. Enquanto isso surgia a ABIG. Não achei que poderia ser imparcial perante a categoria ocupando um cargo em comissão que ficava muito próximo do Governo, e ao mesmo tempo ser presidente da Associação. Ofereci a direção a outros colegas, que não mostraram interesse em assumi-la. Paralelo a isso começamos negociações para abertura de modificação da associação, no lugar de criar a ABIG, contudo, aquele grupo optou pela nova associação. 

A Associação de Inspetores já estava meio que adormecida, e com o advento da nova gestão (Haddad) deixamos ainda mais o caminho livre para ABIG se firmar como representante da categoria de Inspetores – na ABIG existem colegas nos quais eu confio, e até me senti representado, mesmo não sendo filiado. Acreditei que qualquer negociação que fizessem somente acabaria nos ajudando. Como eu disse antes, uma entidade de classe jamais lutaria por perdas. Assim, qualquer ganho, qualquer proposta que possa acrescentar algo de bom já é uma conquista.

4 – Muitos interpretam que a função gratificada é uma forma de comissionamento, permitindo um controle político na escolha dos ocupantes dos cargos previstos, não sendo interessante para administração pública o provimento dos cargos efetivos, pois no caso de não corresponderam ou atingirem as metas, independentemente dos fatores, podem ser mudados a qualquer momento, além do que os cargos efetivos não seriam necessariamente mais de Comando, o Senhor concorda com essa assertiva?  O que precisa mudar?

Eu discordo dessa forma de pensar. Na prefeitura de São Paulo inteira existem os cargos em comissão exclusivos para profissionais de carreira. Eles sempre geraram incorporação depois de permanência por cinco anos na atividade, e um ano para incorporar os próximos, com gratificação maiores. Na GCM sempre houve os cargos em comissão, mas não incorporavam. Havia um tratamento injusto com a GCM em relação aos demais profissionais da prefeitura.  Como agora o cargo incorpora, o ganho é do profissional. A maioria já tem a função de Comandante Regional incorporada, assim, não há que se falar em estarem reféns do governo. Além disso, aceitar um cargo desses envolve maior responsabilidade, é um desafio e um risco. É a oportunidade de se mostrar como um bom ou um mal profissional.  Se hoje a carreira é única, vejo que todos os guardas podem um dia se tornar Inspetor e assim lutar para ganhar essa gratificação.

Na gestão anterior houve uma preocupação para que a distribuição dos cargos em comissão não sofresse intervenção política. Por exemplo, afastou-se a possibilidade de um vereador fazer a indicação para um cargo do alto comando. Criou-se um sistema de meritocracia, que levava em consideração notas de curso da Escola de Comando, desempenho profissional, antecedentes disciplinares, comprometimento etc. Havia oportunidade para que todos conquistassem o cargo por meio de seus esforços. Certa vez eu li em algum lugar alguém dizendo que naquela ocasião havia uma “pseudo meritocracia”. Em minha opinião, ainda que fosse uma “pseudo” meritocracia (o que não era), mesmo assim continua a ser um regime bem mais seguro do que a melhor das escolhas políticas, a qual pode correr o risco de vir desprovida de critérios técnicos e testes de aptidão para o cargo indicado.

Diferente do que muitos pensam, com a meritocracia muitos dos inspetores que estavam esquecidos, que não tinham chances de mostrar sua competência, e que jamais teriam chances de chefiar unidade em um regime de “indicação de amigos”, tiveram ali a oportunidade de se ver nomeados no cargo de Comandante Regional e lá estão até hoje.  Rompemos definitivamente com o velho sistema de “panelinhas” e grupos que se perpetuavam nos altos cargos. Acredito que o atual Comando da GCM está afinado com essa linha de pensamento, pois, como se vê, até agora tem feito boas escolhas para os cargos de direção 

O cargo efetivo continua sendo necessário. O cargo efetivo é a motivação que nos mantém na instituição. É a garantia do não rebaixamento. É mais uma oportunidade de evolução funcional. Ele representa mais uma modalidade de crescimento salarial, porque, ainda que incorporada uma verba de chefia, quando ascendemos na carreira, muda-se o padrão de vencimentos, e o aumento salarial é conseqüência.

Na contramão da sua colocação, entendo que o Governo também fica refém do bom profissional, porque, se ele quer bons resultados, tem que oferecer um cargo em comissão, que pode ser aceito ou não. Se a linha do governo não me agrada, posso recusar o cargo. Acredito que dentre os inspetores a maioria não se venderia por uma gratificação de comando. Se eu ocupo cargo em comissão ainda hoje, é porque estou alinhado com a política do atual governo e porque concordo com as diretrizes do Comando Geral – se eu sair do cargo o meu salário não muda, portanto, estou porque eu e o comando queremos, há uma aceitação bilateral. 

5 – A Secretaria Nacional de Segurança Pública - SENASP, tem divulgado que as carreiras das Guardas Municipais, devam ter 3 tipos de cargos: execução, supervisão e gestão, propondo as Guarda Municipais de maior efetivo uma carreira composta por 10 cargos (GCM – 3ª Classe, GCM – 2ª Classe, GCM – 1ª Classe, Classe Especial, Classe Distinta, Subinspetor, Inspetor, Inspetor Regional, Inspetor de Agrupamento e Inspetor Superintendente), num modelo de carreira única, com escolaridade inicial para o ensino médio e a partir do cargo de inspetor curso superior, não podemos esquecer que temos os cargos de Comandante e Subcomandante, caso estes sejam da carreira, totalizando 12 cargos, como o Senhor avalia essa proposta?

Se bem formulada, uma carreira com mais cargos gera a possibilidade de ascensão a cada três anos. Isso fortalece a motivação, a vontade de acertar, de não incidir em infrações e de aprender sempre para obter êxito nos concursos internos. Isso leva, mesmo que sem perceber, ao crescimento profissional, pois, ao se preparar para prestar o concurso, o profissional revê conceitos, aprende mais e se aprimora.

6 – Na Guarda Civil Metropolitana de São Paulo, há em andamento uma discussão sobre um novo plano de carreira, porque a Associação de Inspetores das Guardas Municipais não participou da Comissão que elaborou a proposta ao Comando Geral?

Não fomos convidados, e nem fomos pedir para participar.

7 – Associação de Inspetores das Guardas Municipais tem uma proposta de plano de carreira para a Guarda Civil Metropolitana de São Paulo? Ela foi apresentada a Administração Municipal?

Tem um processo ainda em trâmite na SMSU (não sei se arquivou) que foi resultado do trabalho de uma comissão instituída, se não me engano, na gestão do Coronel Casado, para alterar a carreira da GCM. Não sei onde está esse trabalho, nem que fim deu. Tem também um concurso de acesso que, na última vez que o vi, estava parado no TCM. A cada governo que entra tenta-se criar um novo plano de carreira. Mal respeitaram o que ai está, e que vai fazer 10 anos agora. Não sei até que ponto alterar a carreira a cada mudança governo pode gerar segurança ou instabilidade. Vou dizer a minha opinião pessoal, não a de presidente: Não trabalho focado na promessa de evolução funcional via novo plano de carreira. Trabalho com o que já temos. Se vier algo melhor, estou no lucro. Se vier algo pior, brigaremos na justiça. A Associação de Inspetores das Guardas Municipais não tem proposta. Podemos sim participar das discussões, mas no intuito de colaborar, não de ser o autor da proposta.


8 – Em 2011, a Guarda Municipal de São Luiz, da Capital Maranhese, conquistou a aposentadoria especial através de lei municipal, que serviu de referência para que outras Guardas Municipais elaborassem projetos semelhantes, como ocorreu em São Paulo no final de 2012, tendo em comum o tempo de serviço, mulher 25 anos e homem 30 anos, numa carreira com 12 cargos, ela não se torna inviável, principalmente para o efetivo feminino, pois mesmo que não tenhamos interstício entre os cargos, comumente a administração não promove concursos de acessos, como poderíamos prover esses cargos de forma efetiva, no caso da Guarda Civil Metropolitana de São Paulo, os concurso de acessos por força de lei devem ser realizados a cada 3 (três) anos, e os candidatos devem ter igual período no cargo que titularizam, portanto, entre abertura do concurso e sua posse, decorre minimamente 01 (um) ano, então são necessários 4 (anos) para o acesso aos cargos superiores, nesta conta para se atingir o último cargo efetivo da carreira seriam necessários quase 40 (quarenta) anos de serviço, o Senhor concorda com esta premissa?


Se não me engano, o concurso de acesso pode ser feito antes dos três anos. Havendo vacância dos cargos e a necessidade do preenchimento, não vejo razão ou impedimento para que façamos concurso de acesso a cada dois anos, ou até menos. E mais, vou tomar como exemplo a Polícia Militar de São Paulo, geralmente o oficial quando chega ao cargo de Major já tem o seu tempo de aposentar. Acontece que, visando chegar a Coronel, ele fica além do seu tempo, e assim chega a promoção. Isso me parece uma lógica bastante razoável, ou seja, o ideal de aposentadoria seria estarmos ao menos uns dois cargos abaixo do último da carreira, para que aqueles que desejarem ir além dos 25 anos (mulheres) e 30 (homes) sejam beneficiados com mais promoção. Seria uma forma de premiar aquele que ainda quer contribuir com a instituição. Outra coisa que eu acho que devemos importar daquela experiência institucional seria a obrigatoriedade de aposentar aquele que, tendo o tempo, não ascendeu na carreira ao longo de cinco anos. Porque, caso não tenhamos uma forma compulsória de tirar o servidor das fileiras, ele pode se tornar uma trava ou impedimento de ascensão para quem vem na fila depois dele.  


9 – Com a aprovação da aposentadoria especial, o Senhor acredita que haverá um esvaziamento na Guarda Civil Metropolitana de São Paulo nos próximos anos?

Se ela for bem administrada, acredito que não. Já ouvi muito relato de profissionais que, mesmo tendo o tempo, ainda querem contribuir com a instituição e nela crescer. E uma boa administração promoveria dentro do tempo necessário um concurso de ingresso para novos guardas, e concurso de acesso para promoção na carreira. O enfraquecimento da instituição não estaria exatamente na falta de efetivo, mas em outras questões.


10 - Guarda Municipal tem poder de polícia?

Tem sim. Todas as atividades que executamos são decorrentes do poder de polícia. É ele quem legitima nossas ações.


11 – Porque as principais lideranças das Guardas Municipais insistem na aprovação de Projetos de Emenda Constitucional (PEC), Projetos de Lei (PL), marcos regulatórios? Eles são realmente necessários?

Acredito que existem projetos eleitoreiros, outros oriundos de políticos mal informados, e alguns consistentes.

Escrevi um artigo recente para o Blog Os Municipais onde falto a respeito da legitimação das ações das guardas municipais por meio de lei municipal. Vale a pena dar uma lida para entender uma pouco mais do assunto. Segue o link: http://osmunicipais.blogspot.com.br/2014/02/principio-da-subsidiariedade-os.html


12 – Recentemente, o Prefeito Fernando Haddad fez uma declaração Guarda Civil Metropolitana de São Paulo, não estaria preparada para combater os ataques ao transporte público, a declaração não foi bem recepcionada nas blogsfera e nas redes sociais, tendo até uma nota de repúdio encaminhada pela Associação Brasileira dos Guardas Municipais – ABRAGUARDAS, foi muito por tão pouco? Considerando a dimensão da Cidade, há um modo eficaz de realizar de forma preventiva a segurança no transporte público de São Paulo, a GCM poderia ser inserida neste contexto?

Bem, nós já tivemos uma unidade especializada que se chamava Inspetoria de Apoio ao Transporte Coletivo. Ela funcionava basicamente no apoio à fiscalização, mas porque não estava trabalhando em todo o seu potencial. Poderia sim dar proteção àquela modalidade de transporte.

Hoje em dia há uma tendência em pessoas se ofenderem por tudo. O prefeito fez uma fala simples “A GCM não está preparada”. Caberia sobre essa expressão várias interpretações. Quem as recebeu, e se doeu, optou pela mais contundente, escolheu o entendimento de que não há preparo operacional, entendeu talvez que não há capacidade de atuação nessa modalidade. Não estão errados de interpretar assim, não lhes tiro a razão. Mas, por outro lado, poderíamos também interpretar que a falta de preparo poderia ser na estrutura, ou seja, falta de efetivo, ou o fato da GCM estar envolvida em outras prioridades; poderia ser falta de planejamento para atuar de imediato. Ora, sejamos realistas, temos que trabalhar de acordo com a nossa capacidade de atendimento de demandas. Querer fazer um pouco de tudo pode resultar em fazer de tudo, mas mal feito. Hoje, se fossemos atuar na proteção dos coletivos, teríamos que sacrificar alguma outra proteção, fazer um planejamento, enviar efetivo, viaturas e pensar em uma forma de atuação. Pode ser que o prefeito estivesse apenas chamando o Estado, a PM, para as suas co-responsabilidades, e com isso não estivesse desmerecendo o trabalho da GCM. Recentemente vimos na televisão uma equipe de GCM’s que não conseguiu evitar a depredação de uma viatura diante de uma multidão de manifestantes (manifestantes ou vândalos?). Como poderia então, essa mesma equipe, evitar a depredação de um ônibus diante da multidão? Um serviço de proteção desse tipo depende sim de muito treino e preparo para atuação com qualidade.

13 – As principais capitais tem sido palco de manifestações públicas, por protestos variados, há mortes, agressões voluntárias entre manifestantes e polícia, depredações do patrimônio público, no aniversário de São Paulo, a imagem da viatura de Guarda Civil Metropolitana de São Paulo sendo depredada correu o mundo pelas diversas mídias, falta preparo dos órgãos de segurança para agir neste tipo de manifestação? Não se faz necessário a intervenção do Ministério Público?

No caso da Guarda Civil Metropolitana, até por estarmos voltados para outros tipos de atividades, não vi ainda nossos agentes serem submetidos a qualquer treinamento focado nesse tipo de ação, seja no enfrentamento, na mediação ou na negociação – o que é perfeitamente normal quando não se atua nessa modalidade de proteção. É bem possível que a Polícia Militar possua unidades especializadas pata tal. Não posso entrar no mérito dos resultados das ações, porque essa não é a minha especialidade. Não sabemos, por exemplo, que dimensões as manifestações teriam tomado se a PM não tivesse agido. Poderia ter acontecido algo pior? Não sei. Como cidadão, posso afirmar que boa a situação não está, principalmente nos casos em que ocasionaram “quebra-quebra”, com atos de violência contra pessoas e danos a terceiros.

Não vejo neste caso onde o MP poderia atuar, senão, cobrando maior efetivação das ações e responsabilizando os culpados pelos delitos. Precisamos sim de especialistas no assunto. Se o fato é novo no Brasil, em outros países não são. Por isso, defendo que a preparação dos profissionais das guardas municipais ou das polícias deva passar por treinamento no exterior, em lugares onde o governo teve sucesso nas tratativas dos casos análogos.

14 – O Brasil tem sido alvo de notícias negativas sobre a violação dos Direitos Humanos, o mundo ficou horrorizado com a barbárie promovida pelos detentos no presídio de Pedrinhas no Maranhão, demonstrando que a violência está enraizada em algumas pessoas, porém o destaque foi maior com a ação da polícia para conter a rebelião, como os órgãos de segurança pública devem agir nessas situações? O senhor é a favor da privatização do Sistema Prisional?

No Brasil existe a “patrulha do politicamente correto”. Todos têm medo de colocar a mão em certas feridas. A questão dos presídios vai além da competência dos órgãos de segurança pública, ao menos em relação àqueles definidos no artigo 144 da CF. Constitui-se outro erro pensar que cabe à polícia intervir nas penitenciárias.  Ali reside um problema grave de má gestão somado à falta de coragem de tomadas de certas decisões polêmicas. Novamente cito a necessidade de importar modelos de países que tiveram sucesso com essa problemática – importar legislações, forma de gestão de respostas para as inconformidades, mesmo que para isso seja necessário implantar mais rigor e privar mais alguns direitos dos detentos..

15 – O Conceito de Segurança Urbana surgiu em São Paulo no início de 2000 e se expandiu rapidamente pelo país, tendo apoio da SENASP e do Ministério de Justiça, porém não encontra respaldo na doutrina ou na legislação, está focada tão somente nos municípios, o que a difere de segurança pública?

O conceito de Segurança Urbana está em fase de construção doutrinária, e em estado bastante avançado. Já existem livros a respeito do assunto. Em termos de normas, encontra-se bem definida em legislações e decretos municipais. O fato de estar em legislações locais não diminui a sua importância no cenário nacional.

Penso que Segurança Urbana é bem mais abrangente que Segurança Pública, esta é espécie daquela, ou seja, uma de suas vertentes.

Segurança Urbana envolve transversalidade. É plural. Passa pela educação, saúde, assistência social e mais tantos outros segmentos.

Se observar o texto da Constituição Federal, percebe-se que a Segurança Pública se promove ou com policiamento ostensivo e preventivo – e daí conclui-se que a ostensividade é que gera e prevenção; ou com investigação pós crime.

A Segurança Urbana vai bem além disso. Seu trabalho atinge não só a “ponta do iceberg”, o crime acontecendo ou na iminência de acontecer. Ela trabalha na formação dos indivíduos, dos grupos; na reorganização da cidade para torná-la menos propícia aos delitos; utiliza-se de técnicas de mediação do conflito; conta com uma infinidade de parceiros – segmentos religiosos, grupos de tratamentos, institutos de promoção da cultura de paz entre outros.

Enfim, para falar de Segurança Urbana, dada a sua amplitude e o tamanho da sua abrangência, precisaríamos de outra a oportunidade, outro momento, talvez outro debate, que não cabe aqui neste contexto.

16 – A segurança urbana trouxe algumas diretrizes de ação, como desordem urbana, zeladoria, posturas municipais, transformando o Guarda Municipal de algumas cidades como agente multidisciplinar, porém, os segmentos trânsito, meio ambiente, comércio ambulante, pessoa em situação de risco, combate as drogas, policiamento escolar, não requer um especialista? O emprego de Guardas Municipais nestes segmentos auxilia no combate a criminalidade?

Cabe às unidades de formação de guardas torná-los especialistas nesses tipos de atuação. Sem dúvida, todas essas modalidades de atuação que você citou são ações de enfrentamento da criminalidade, a maioria, na modalidade preventiva


17 – Na opinião do Senhor quais são as principais políticas públicas de segurança no país?

Talvez esse seja o problema. O nosso pais não tem políticas públicas eficientes e bem definidas. Patinam entre a sujeição ao que se mostra como “politicamente correto”, cultuam experiências mal sucedidas, campanhas eleitorais com promessas impraticáveis, oportunistas de momento, imprensa sensacionalista, grupos que jogam a população contra a polícia, manifestantes sem causa, expressão cultural quase que de apologia ao crime, movimentos antiproibitórios, excesso de relativismo etc.

Pois bem. Se há tantas diferenças sociais, tantas ideologias e pensamentos antagônicos; o correto seria começar pela reformulação dos conceitos a respeito do que vem a ser transgressão, quais bens continuarão sendo juridicamente protegidos, e o que a população espera hoje de intervenção nesse segmento – segurança pública e segurança urbana.

Ora, não é a polícia que tem que se posicionar, por exemplo, sobre o que fazer com o uso da maconha.  Ela fica a mercê da sociedade. Se os representantes do povo convencionarem através de lei que a venda da maconha deve ser combatido, a polícia combaterá; se não, ela deve se abster e focar sua estrutura outras prioridades. Precisamos, então, redefinir as áreas de atuação a partir da vontade popular, mas pelo visto, esta não encontra consenso em nossa sociedade.


18 – O senhor acredita que projetos como desmilitarização, unificação e municipalização das polícias no Brasil vão ser aprovados?

A mudança principal deve começar pelos conceitos. Não é o fato de ser militar que torna o policial violento. Isso está mais ligado à cultura institucional. A mudança de militar para civil pode ter, quando muito, um mero significado simbólico.

A unificação também, neste momento, não seria possível. São formas diferentes de trabalho. São conceitos e culturas que dificilmente se misturarão. Se unificar as polícias estaduais passaríamos a viver um período de transição e conflito cujo momento na atual conjuntura da necessidade de enfrentar violência não permitiria se dar ao luxo de esperar.

O ideal seria a municipalização gradativa. Aproveita-se o sistema estadual que hoje ai está, enquanto se prepara o fortalecimento das guardas municipais para assumir boa parte das demandas. Não pode haver uma mudança brusca. Digamos que muitas guardas ainda estão no processo de estágio prático. Não cabe a ruptura imediata com o atual sistema. É necessário que primeiro coexistam, para depois deixar que o novo e moderno sistema se estabeleça em definitivo, com o conseqüente abandono do atual sistema ineficiente e falido que ai está.

19 - O Sistema de Segurança Pública Unificado é um embrião, mas talvez com a Copa do Mundo e Olimpíadas ele possa evoluir muito, o Senhor acredita realmente no compartilhamento de informações dos órgãos de segurança pública em nosso país??

Acredito que deveria haver não só o compartilhamento de informações, mas também uma atuação cooperada. Contudo, hoje isso está muito longe de acontecer integralmente. No meu entendimento, enquanto órgãos policiais forem dependentes de política de governo a tendência é de aproximação entre as polícias pertencentes aos governos do mesmo partido, e o afastamento entre polícias de governos opositores. Precisamos que haja somente política de Estado na gestão dos órgãos de segurança. Governos não deviam interferir tanto na atividade policial no que se refere ao trabalho técnico. Deveria haver um tipo de autonomia semelhante à do Ministério Público. Não pode haver em hipótese alguma o uso político da polícia. As polícias precisam passar por uma de redefinição de suas missões e atribuições, com parcela delas repassadas para as guardas municipais e assim, uma vez bem definidas, zelar para que não possam ser alteradas a cada mudança de governo. Neste ponto eu seria favorável ao controle externo das polícias somente pelo Ministério Público e Poder Judiciário, inclusive das informações, as quais, uma vez geridas por eles, não seriam omitidas nem desvirtuadas, mas compartilhadas de acordo com o grau de interesse e competência funcional de cada uma delas.

20 – Qual a mensagem final que o Senhor gostaria de transmitir aos nossos leitores.

Se eu pudesse deixar um conselho, eu diria para aos integrantes das guardas municipais que deixem vaidades e disputas de lado. Procurem somar esforços com todos os segmentos de segurança hoje existente. Que saibam reconhecer as suas deficiências, e buscar o aprimoramento incansável da sua atuação. É preciso deixar de lado questões políticas e não ter vergonha de imitar ou aprender com o que está dando certo. Tenham humildade e tolerância com as diversidades de opiniões. Lutem pela liberdade, igualdade e fraternidade. Estudem, leiam, debatam e participem da construção da sua sociedade. Compreendam o real significado de servir à população. Não tentem fazer mais do mesmo, principalmente de uma mesmice que não funciona – não lutem para fazer parte de um sistema falido. Seja o novo, o melhor, para que assim, sempre mantenham da instituição em que trabalham como sendo um órgão moderno, preventivo e comunitário.

"Fuja dos elogios, mas esforce-se por merecê-los, sempre" (François Fénelon).


"Do sublime ao ridículo, só um passo é necessário." (Napoleão Bonaparte)